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quinta-feira, 21 de dezembro de 2017


O Livro dos Sábios (1870)


RESUMO GERAL - Por definições e aforismos
(XII Capítulos)


CAPÍTULO VIII - A
I - Certo dia uma mulher apareceu numa praça de Alexandria. Numa mão portava uma tocha acesa e na outra uma vasilha com água. "Com esta tocha", exclamou, "quero incendiar o céu; com esta água quero extinguir o inferno para dissipar todos os fantasmas que ocultam o meu Deus e não crer mais do que nele só".
II - Nós não podemos compreender  Deus. Podemos apenas saber o que dizemos quando sussurramos o seu nome; porém, sentimos em nós uma necessidade imperiosa, invencível, absoluta de crer e de amá-lo.
III - Pode-se amar seriamente, pode-se amar por muito tempo aquilo que não existe? Pois bem, o amor de Deus é o único que dura tanto como a vida e que se sente bastante poderoso e bastante crente para acreditar na vida eterna!
IV - Oh, sim! Ele muito mais do que somos nós, porque o amamos mais que a vida. É melhor que todas as bondades humanas, porque o amamos mais que aos nossos pais e às nossas mães. E mais belo do que todas as belezas mortais porque o amamos mais do que as nossas mulheres e as nossas filhas.
V – As nossas almas têm fome da divindade, têm sede do infinito e sentimos os nossos corações crescerem até a imensidão no sonho do sacrifício eterno.
VI - Tudo é de seu ser, tudo vive da sua vida. Tudo irradia da sua luz; tudo ri e canta da sua alegria. Ele está em nós, está ao redor de nós, toca-nos, fala-nos, chora em nossas lágrimas, fortifica-nos na nossa dor; esquece-se dos nossos erros e lembram-se dos nossos bons desejos; tudo o que se ama de belo, tudo o que se deseja de bem, tudo o que se admira de grande, tudo o que se exalta de sublime, é ele, é ele, é ele. Ele está em tudo; todo inteiro em toda a parte sem que possa ser dividido ou contido. Não é nada do que podemos ver, tocar, mostrar, medir, definir.
É tudo o que podemos desejar, admirar, venerar, amar. Ele não é o ser, o princípio do ser; não é a vida, é o pai da vida; é mais verdadeiro do que a verdade, mais imenso que a imensidade, melhor que a bondade, mais belo que a beleza. Toda a substância vem dele, porém ele mesmo não tem substância. Nele tudo é lei sem ser constrição, tudo é liberdade sem antinomia e sem antagonismo; a sua vontade é imutável e não está acorrentada, pode tudo o que quer e não pode querer se não o bem. Na afirmação eterna do verdadeiro, do belo, do bem e do justo. É a inalterável serenidade de um sol sem declinação. Jamais interrompe o curso das suas leis, não opera sobre o homem senão pela natureza, não se irrita nem se acalma e nós não lhe rogamos para aprender e para nos exercitarmos em desejar o bem!
VII - Que se pode dizer quando tentamos falar dele, senão incoerências e absurdos? Não é ele o infinito indivisível, o todo sem partes, o existente sem substância?... Dogmas humanos, palavras de delírio, sejam esquecidas! Deus seria finito se pudesse ser definido; não falemos mais dele, vivamos para sempre em seu amor! Símbolos, imagens, alegorias, lendas, são os sonhos da sua sombra... o amor é a realidade da sua luz.
VIII - Amemos a verdade, amemos a razão, amemos a justiça e amaremos a Deus e lhe renderemos o verdadeiro culto que pede! Amemos tudo o que foi criado, tudo o que anima, tudo o que ama e senti-lo-emos viver em nós!
IX - Comunguemos com ele, comunguemos uns com os outros, comunguemos! Eis aqui a última palavra da fé universal! Comunhões, digo; e não mais excomunhões!
X - Aquele que excomunga, se excomunga. Aquele que maldiz, se maldiz. O que reprova, se reprova. A condenação só é condenada.
XI - "Nós temos o Alcorão", dizem os partidários do Islamismo; "Para que serve o Alcorão", dizem os cristãos, "se temos o Evangelho?". "Para quê o Evangelho" dizem os hebreus: "nós temos o Sepher Torah". E eu digo: para quê o Sepher Torah se temos a Deus? Porém estes livros sagrados são como os véus de diferentes cores que estavam superpostos sobre o Tabernáculo.
Viva Deus no Alcorão! Viva Deus no Evangelho! Viva Deus no Sepher Torah! Porém, por cima de tudo, vive Deus no coração dos justos! Viva Deus na justiça e na caridade! Viva Deus na solidariedade e na fraternidade universal!
XII - Amar a Deus é ver a Deus. Deus não é visível senão pelo amor, e este amor é a recompensa dos corações puros. Sente-o eterno, sente-o infinito. Não se define nada, não se procura nada, não se duvida de nada, não se teme nada, não se desejada nada se se o ama!
XIII - A aquiescência perfeita da lei, a calma inalterável na contemplação do que é, a esperança desinteressada do que deve ser, a certeza do bem e o repouso no absoluto, eis aí o Nirvana de Cakia-Muni tão mal interpretado pelos que querem ver nele o aniquilamento da iniciativa Humana; eis aí a perfeição do homem.
XIV - O amor divino é o pai dos verdadeiros milagres; ele transforma a natureza, dá à dor uma atracção maior do que a do prazer; sobe e cresce sobre os obstáculos; cria um mundo fechado à ciência e à filosofia; é o esplendor através do véu; é a real idade que os invade de repente e que os fixa numa convicção mais inquebrantável que todas as certezas humanas.
XV - Sem, o amor divino não se pode amar aos homens: os homens sem pai não têm irmãos. O homem é um monstro para o homem sem Deus.
XVI - A eternidade bem-aventurada começa com o amor divino; estamos na glória, estamos no céu, moramos no infinito!
XVII - Que me cubra com púrpura de Salomão com as úlceras de Job, eu direi: " amo-Te ". Se me diz: " expulso-te da minha presença", responderei. " amo-Te e a tua presença me seguirá". Se me diz: " reprovo-te ", responderei: " escolho- Te ", e se ele quer torturar-me, o meu amor tomará asas para se elevar mais alto que as nuvens, e caminhará sobre a tempestade.
XVIII - É que eu não creio no Deus dos homens, eu creio no Deus de Deus mesmo!... eu creio neste amor sobrenatural que é a omnipotência de Deus vivo para sempre no meu coração.
XIX - Bendirei nas cidades e nos campos, nos desertos e sobre os mares! Rogar-lhe-ei nas Igrejas, ao ruído misterioso dos órgãos, proclamá-lo-ei nas sinagogas, aos esplendores do Buccin, prosternar-me-ei ante ele nas mesquitas, ao chamado monótono do Muezzin... Porém melhor que tudo isto e seguindo a palavra do grande mestre, retirar-me-ei no meu quarto e rogar-lhe-ei no meu coração!
XX - Retirar-me-ei na solidão, porém não ficarei fechado nela. Está por acaso Deus comigo só? Não está vivente na natureza inteira? Não se expande a sua beleza nas flores, nas crianças e nas mulheres? Não se sente no meio das debilidades e das agitações dos homens a força que os domina e que os conduz? Não fugirei, pois, dos homens porque as suas vaidades me enojam: seria egoísta e enganar-me-ia se dissesse que amo a Deus. Amarei a teus filhos, o, meu pai! Sobretudo quando estiverem doentes e parecerem abandonados por ti; porque então pensarei que os confias a mim. Chorarei com os que choram, rirei com os que riem, cantarei com os que cantam. As carícias de uma criança far-me-ão estremecer de alegria e a lembrança de uma mulher me fará sonhar em teu amor.
Porque não há nem malditos nem bastardos na tua família Criaste tudo em tua sabedoria e conduziste tudo ao bem pela tua bondade. Todo o amor vem de ti e volta a ti. A mulher  a medianeira da tua graça; e, o vinho que revigora o coração do homem o auxiliar do teu espírito. Longe de mim os que te caluniam e dão o teu nome a execráveis imagens. Que se esqueça para sempre esse pesadelo da antiga barbárie, esse verdugo das suas criaturas a quem acumula numa imensa podridão onde conserva-as vivas salvando-as com fogo! Que se despreza para sempre a esse amo caprichoso como a uma cortesã romana que escolhe uns e rejeita outros, que se irrita definitivamente por um esquecimento, que sacrifica para si a seu próprio filho em favor daqueles contra quem não lhe apraz irritar-se, tornando-se cada vez mais implacável para com todos os demais! Velhos ídolos, velhos erros, nuvens disformes da noite, das antigas idades, o Sol levanta-se, os seus raios atravessam de todos os lados, como flechas de ouro. Retira-os para a noite, nuvem de inverno, a Primavera sopra, dissipa-os, passai, passai!
XXI - O homem não é, não nunca foi e jamais será infalível, quaisquer que sejam as suas pretensões e suas dignidades sacerdotais. Não há outra infalibilidade do que o amor supremo unido a absoluta razão.
XXII - A razão sem amor carece de exactidão na ordem moral, porque carece de justiça. O amor sem razão conduz fatalmente à loucura. Tenhamos pois, fé no amor inseparável da razão.
XXIII - Com esta fé, se sabeis, se quereis, se ousais e se tens a arte de calar-vos, sereis mais forte do que o mundo; e, o céu e a terra, cumprirão as vossas vontades. Fareis, seguindo a promessa de Cristo, todos os milagres que ele fez e até maiores ainda. O Mal desaparecerá ante vós e a dor será trocada por consolações divinas. Sentireis em vós a vida eterna e não temereis mais a morte.
Nada vos faltará e não tereis mais decepções na vida. Os que queiram prejudicar-vos, danar-se-ão a si mesmos e vos farão o bem. Tereis a riqueza como auxiliar, a pobreza por salvaguarda e por amiga; porém a horrorosa miséria não vos acercar-se-á jamais. Os espíritos do céu vos acompanharão e vos servirão. A providência cumprirá e proverá todos os vossos desejos. Vosso alento purificará o ar, vossa palavra espargirá a alegria nas almas; vosso contacto devolverá a saúde aos doentes; se cairdes não vos ferireis e se querem fazer-vos mal, este retornará sobre quem o tenha querido.

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