Os exorcismos mais impressionantes autorizados pelo Vaticano – Complemento do texto
"A SOBREVIVÊNCIA DA ALMA"
SÁBADO, 15 DE JUNHO DE 2013
De: arquivosdoinsolito.blogspot.pt
É
necessário um relatório médico a confirmar que a ciência não explica os
sintomas. Há pessoas que têm de ser amarradas e os casos graves são levados ao
Papa. O Patriarcado fez um documento a reconhecer que os pedidos de
exorcismo estão a aumentar.
Por Patrícia Silva Alves
A
cerimónia começou pouco depois das 10h30. O padre estendeu a mão direita sobre
a cara de Marta sem lhe tocar. Fechou os olhos e sussurrou preces
ininteligíveis. Então surgiu um som intenso, que veio do centro da sala, onde a
espanhola de 20 anos estava deitada num colchão. Marta estava possuída. Ao lado
tinha o padre católico José Antonio Fortea. Tudo aconteceu em 2002 numa igreja
em Alcalá
de Henares, a 30 quilómetros de Madrid. Na capela havia ainda um altar enorme
com uma toalha branca onde estavam pousadas seis velas. Atrás, uma grande cruz
iluminada por luzes de halogéneo. O local não tinha janelas, nem saídas. Antes
de tudo começar, o padre fechou a porta à chave, por dentro.
–
Hic est dies [hoje é o dia] – disse o padre em latim com o crucifixo na
mão.
–
Não – respondeu uma voz rouca de homem que saiu da garganta de Marta.
–
Exi nunc [sai agora], Zabulón.
–
Não.
–
Porque não queres sair?
–
Para servir de testemunho.
–
De quê?
–
De que Satanás existe.
Esta
descrição é de José Manuel Vidal, editor da seção de religião do 'El Mundo' e
um dos vaticanistas espanhóis mais respeitados, que foi convidado a assistir ao
exorcismo. O artigo que relata a experiência foi publicado com o título 'O
exorcismo que presenciei em Madrid'. O nome Marta e o da mãe, que a acompanhou
na sessão, são fictícios. O do padre não é.
José
Antonio Fortea, agora com 45 anos, é um dos principais exorcistas católicos
espanhóis. A sua formação começou com uma tese de licenciatura sobre exorcismos
que foi orientada pelo porta-voz da Conferência Episcopal espanhola, o bispo
Juan Antonio Camino.
Foi
por causa dela que aprendeu a fazer exorcismos – assistiu a 13. Há três anos
que não exerce. Agora está em Roma a preparar a tese de doutoramento sobre o
mesmo tema.
Gabriele
Amorth terminou um exorcismo feito por João Paulo II no ano 2000
De
acordo com o jornalista, no dia em que Marta foi exorcizada por Fortea, a
espanhola parecia uma rapariga normal. Vestia uma blusa azul-celeste de manga
curta com gola alta e calças de ganga. Fora levada até ao exorcista pela mãe
depois de consultarem dois psiquiatras que não encontraram explicação para as
suas persistentes dores de cabeça.
Estava
saudável, diziam. No entanto, as fortes dores continuavam e Maria, a mãe,
recorreu a Fortea. O diagnóstico foi perentório: Marta estava possuída por
sete demónios há cinco anos. Ao longo de 16 exorcismos, Fortea
conseguiu expulsar seis. A descrição feita pelo jornal corresponde à 17.ª
sessão, para expulsar o demónio que resistia. O que o jornalista ouviu não correspondia
ao tom de voz de Marta. Era um som rouco e masculino que ia aumentando à medida
que o padre continuava a rezar.
Os
movimentos também. A dada altura, o corpo de Marta começou a agitar-se
fortemente e a contorcer-se, enquanto a cabeça rodava de um lado para outro.
Primeiro lentamente, depois com uma súbita rapidez. A sessão prolongou-se por
quase três horas. Num determinado momento, “a jovem gritou, bufou, colocou os
olhos totalmente em branco, arqueou o corpo e levantou-se toda a um palmo do
chão”. Tudo acabou sem que a possessão terminasse. De repente, Marta voltou-se
para os presentes, levantou-se e colocou os brincos que tinha retirado para a
sessão. Não se lembrava de nada.
O
debate sobre os exorcismos na Igreja Católica reacendeu-se desde que a 19 de
Maio, domingo de Pentecostes, em que se celebra a descida do Espírito Santo
sobre os apóstolos, o Papa Francisco colocou as mãos sobre a cabeça de Ángel
V., um mexicano de 43 anos, na Praça de São Pedro, em Roma. Manteve-as assim
durante 13 segundos (mais sete do que a pessoa anterior a quem abençoou) em que
Ángel se encolheu.
O
homem, que estava sentado numa cadeira de rodas, diz-se possuído desde 1999.
Rapidamente surgiram notícias de que o gesto do Papa tinha sido um exorcismo, o
que foi negado pelo porta-voz do Vaticano, Federico Lombardi. Mas há quem
conteste a versão oficial.
“O
que o Papa fez foi um exorcismo e se o padre Lombardi diz o contrário é porque
não percebeu nada do que se passou”, disse, por exemplo, ao vivo na rádio Rai
2, Gabriele Amorth, um dos mais reconhecidos padres exorcistas do mundo.
O
italiano, hoje com 85 anos, pertence à Sociedade de São Vicente de Paulo e foi
nomeado exorcista de Roma em 1986 pelo cardeal Ugo Poletti, que durante 18 anos
foi vigário-geral da diocese.
O Papa Francisco não nega a existência do Diabo. Por exemplo, na sua
primeira homilia, a 14 de Março de 2013, disse aos cardeais reunidos na Capela
Sistina: “Aquele que não reza a Deus reza ao Demónio.” Aliás, o Vaticano reconhece
que João Paulo II fez três exorcismos durante o seu pontificado. O primeiro
aconteceu a 27 de Março de 1982. Uma italiana chamada Francesca Fabrizi, então com
22 anos, chegou até ao Papa através de Ottorino Alberto, na altura bispo de
Espoleto. A reação dela foi imediata. “Ao vê-lo, começou a gritar e a
rebolar-se pelo chão, não se preocupando que o Papa ordenasse ao Diabo que
saísse dela”, descreveu Gabriele Amorth, no livro
'O Último Exorcista', lançado em Portugal em 2012 pela Paulinas Editora.
No
entanto, de repente, tudo mudou quando João Paulo II disse a Francesca:
“Amanhã, direi a missa por ti.” Nesse momento, a italiana acalmou-se. Um ano
depois, visitou o Papa. Nunca mais tinha tido ataques, estava casada e grávida.
Na altura, João Paulo II comentou com o cardeal Jacques-Paul Martin, antigo
prefeito da Casa Pontifícia:
“Nunca tinha visto uma coisa assim. Uma verdadeira cena bíblica.”
O
mais famoso exorcismo de João Paulo II aconteceu, porém, a 6 de Setembro de
2000. Foram precisas 10 pessoas para segurar Sabrina, que, mal viu o Papa a
entrar na Praça de São Pedro, começou a gritar palavrões e a contorcer-se. Apesar
de a praça estar cheia, João Paulo II notou a presença da rapariga de 19 anos e
pediu ao seu secretário, o então bispo Stanislaw Dziwisz, que lha levasse.
No
domingo de Pentecostes, o Papa abençoou Ángel V., mexicano de 43 anos que se
diz possuído desde 1999
O
Papa e Sabrina encontraram-se numa sala privada ao lado da Basílica de São
Pedro. A mulher, que fora arrastada até lá pelos pais, estava em transe. “Os
seus olhos eram duas órbitas brancas. Babava-se e tinha a cabeça pendente para
trás. Logo que foi levada até junto do Papa começou a gritar e a tremer”, conta
Gabriele Amorth. “O Papa fez-lhe um exorcismo nesse lugar. Abençoou-a várias
vezes. E, depois, deixou-a ir-se embora.” O processo demorou 30 minutos,
durante os quais João Paulo II realizou o chamado exorcismo menor, que não
implica a leitura de textos bíblicos. Deu-lhe uma bênção, abraçou-a e Sabrina
acalmou-se.
A
possessão da italiana era intensa e resistente. Nessa tarde, Gabriele Amorth,
que estava a acompanhá-la no processo semanal de exorcismos, teve de continuar.
“O Diabo estava enfurecido por causa do encontro com o Papa e, ao mesmo tempo,
sentia-se forte, porque o exorcismo não tinha conseguido expulsá-lo”, explica o
padre.
O
que viu a seguir deixou-o sem palavras. “Sabrina levantou-se da cadeira em que
estava sentada. Dirigiu-se a mim. Passou ao meu lado sem me olhar. Foi direita
à parede atrás de mim e começou a caminhar horizontalmente pela parede em direção
ao teto, como se fosse a coisa mais natural do mundo. Depois, desceu como se
não fosse nada”, descreve Amorth em 'O Último Exorcista'.
Sabrina,
que não se lembrava de nada após o exorcismo, continuou a ser acompanhada pelo padre
durante anos até se libertar por completo. O texto-base que orienta o ritual do
exorcismo foi escrito em 1614 e permaneceu inalterado por 385 anos: em 1999, o
Vaticano atualizou o documento 'De Exorcismis et Supplicationibus Quibusdam'
(Sobre exorcismos e certas súplicas) – uma prova da importância do tema
durante o pontificado de João Paulo II. Não que Bento XVI fosse alheio às
questões ligadas a Satanás.
De
acordo com Gabriele Amorth, o Papa Emérito também ajudou a exorcizar dois
homens, numa quarta-feira de Maio de 2009. De novo, o caso aconteceu na Praça
de São Pedro. Entre a multidão de fiéis que o saudava estavam dois homens
possuídos, Giovanni e Marco, guiados por duas mulheres, assistentes de Amorth.
A passagem de Bento XVI no seu jipe branco teve um efeito visível em Giovanni,
que começou a tremer e a bater os dentes. “O jipe percorreu toda a praça. Os
dois dobraram-se e bateram
com a cabeça no chão”, relata o padre em 'O Último Exorcista'. A reação
intensificou-se à medida que o Papa se aproximou. Quando Bento XVI desceu do
carro, os dois homens começaram a gritar estendidos no chão. Alertado pela voz
de uma das assistentes do padre exorcista, o Papa olhou para o grupo e abençoou
os quatro. O movimento suscitou a reação imediata dos dois homens. “Caíram três
metros para trás. Estavam exaustos e já não gritavam, mas choravam. Gemeram
durante toda a audiência. Depois, quando o Papa se foi embora, voltaram a si.
Tornaram-se eles próprios.” Segundo a versão oficial do Vaticano, Bento XVI não fez
qualquer exorcismo nesta ocasião. O tema é polémico dentro da Igreja Católica.
Há
poucas semanas, o cardeal Rouco Varela, arcebispo de Madrid e presidente da
Conferência Episcopal espanhola, nomeou de emergência oito novos exorcistas. De
acordo com a publicação online especializada em temas religiosos
'Religión en Libertad', isso deveu-se à “enorme avalanche de pedidos de ajuda relacionados com influências maléficas”.
Os
exorcistas vão trabalhar em colaboração com um grupo de psiquiatras que
ajudarão os padres a perceber se há ou não possessão.
João
Paulo II fez três exorcismos, reconhece o Vaticano
Em
Espanha, 26% das dioceses têm padres exorcistas autorizados. Em Portugal não há
números oficiais dos padres nomeados por bispos diocesanos – uma exigência para
que possam celebrar um exorcismo.
Em
resposta à SÁBADO, fonte oficial da Conferência Episcopal apontou o nome
de Duarte Sousa Lara, padre da diocese de Lamego e filho do antigo
subsecretário de Estado de Cavaco Silva, Antônio
Sousa Lara. O pároco é o único exorcista reconhecido pelo Vaticano que dá a
cara em Portugal. Nomeado a 20 de Março de 2008 pelo bispo de Lamego, Sousa
Lara assistiu a vários exorcismos de Gabriele Amorth, que, a 23 de Fevereiro de
2007, escreveu uma carta em que o considerou “idóneo para o ministério de
exorcista”.
A
julgar por um documento emitido por D. José Policarpo e pelo Patriarcado de
Lisboa em Fevereiro de 2012, o seu
trabalho será cada vez mais requisitado. “Tem vindo a aumentar o número de
pessoas que, por se considerarem atormentadas pelos poderes do Mal, recorrem à Igreja
procurando auxílio espiritual”, lê-se no texto que acompanhou a publicação das
'Normas Pastorais', um conjunto de regras que os padres devem seguir na
celebração de bênçãos, funerais e exorcismos.
No
entanto, quando contactada pela SÁBADO para atualizar a informação sobre
a procura de exorcistas na diocese de Lisboa, fonte oficial não avançou com
dados concretos. Nas Normas Pastorais está uma espécie de guia prático para os
párocos portugueses lidarem com casos em que há suspeitas de possessão.
Primeiro,
é preciso discrição. “Todos os meios de comunicação social estão excluídos”
antes, durante e depois dos exorcismos, aconselha o Patriarcado de Lisboa.
Depois, é preciso precaução. Os padres têm de “distinguir corretamente entre os
casos de ataque do Diabo e aquela credulidade com que algumas pessoas, mesmo
fiéis, pensam ser objetos do malefício”.
É
ainda preciso descartar dúvidas. O documento aconselha os religiosos a
certificarem-se de que “as pessoas atormentadas não tenham passado, sobretudo
na infância, por situações traumáticas, como abusos físicos, psicológicos ou
sexuais”, pois é muito provável que nessas situações “se trate de sugestão ou
autossugestão de doenças do foro psicossomático”.
Aldina
Cardeal foi exorcizada – não conseguia sair de casa
Finalmente,
é preciso
uma certeza científica. Um padre exorcista não deve avançar “sem antes consultar peritos
em ciência médica e psiquiátrica, que tenham a sensibilidade das realidades espirituais”.
Aliás, o Patriarcado aconselha que se consultem dois especialistas. E há casos
de médicos que assumem tê-lo feito. Victor Amorim Rodrigues, psiquiatra e
professor de Psicopatologia do ISPA – Instituto
Superior de Psicologia Aplicada, é um deles.
Há
alguns anos, quando uma paciente com cerca de 40 anos lhe pediu um relatório
para entregar a um exorcista, o especialista aceitou fazê-lo mesmo sendo
cético. “Se não tinha resposta, se ela já tinha passado por vários técnicos que
também não tinham a resposta e se, objetivamente, não estava a conseguir
melhorá-la, não me pareceu correto impedi-la, quanto mais não fosse pelo efeito
da sugestão. A ciência está muito longe de saber tudo”, diz à SÁBADO Victor
Rodrigues.
A
paciente, uma enfermeira, estava numa situação de “grande apatia”. “Tinha
algumas
características
da depressão, mas não a tristeza e o desânimo”, diz o especialista. Isso tinha efeitos
no seu dia-a-dia. Como estava a ficar cada vez mais lenta, quer a nível motor
quer intelectual, começou a ter problemas no emprego. “Estava tão apática que a
própria chefe lhe dizia que não estava em condições de trabalhar”, explica o
médico. Victor Rodrigues nunca mais soube da enfermeira, que não voltou ao
consultório.
Este
foi o único caso em que o especialista escreveu um relatório para um exorcista
– um documento no qual incluiu, por iniciativa própria, a sua vinheta de
médico. Acompanhou outros casos de pessoas que se diziam possuídas pelo
demónio, mas eram casos de doenças psiquiátricas. De acordo com o documento
emitido pelo Patriarcado de Lisboa, o exorcismo tem por objetivo “expulsar
os demónios ou libertar da influência diabólica”. (Portanto
os demónios
existem e só agora, neste século, é que a Igreja católica o vem
admitindo abertamente, porque a ação desses demónios tem aumentado exponencialmente, como previsto no
livro do Apocalipse. As igrejas protestantes e grupos evangélicos sempre abordaram este assunto
sem tabus, e sempre praticaram abertamente, sem tabus, os exorcismos. R)
E
para isso há um conjunto de sintomas que podem, e devem, manifestar-se para que
alguém seja exorcizado. Um deles é a aversão às imagens e símbolos considerados
sagrados pelos católicos. Por vezes, essa confirmação é feita de forma propositadamente
dissimulada.
Sabendo
que a reação à água benta é um dos sinais de quem está possuído, o padre
Gabriele Amorth costumava misturá-la com a comida que dava ao possível possuído
para saber se estava realmente influenciado. Em caso positivo, a pessoa
cuspia-a. Durante os exorcismos costumam acontecer reações violentas, porque
uma das formas de saber se alguém está possuído é ver também se a pessoa
manifesta “forças acima da sua idade e condição natural”, diz o Patriarcado de
Lisboa. Por causa disto, o padre Gabriele Amorth tratava os casos mais graves
numa igreja em Roma, na via Emanuele Filiberto, pois era um local recatado. Lá
tinha tudo o que precisava, como
uma cama pequena e cordas para amarrar as pessoas mais agitadas. Aos
33 anos, Aldina Cardeal era um desses casos. A professora do Porto foi exorcizada
durante um ano em várias sessões por um padre português nomeado para esse
efeito por um bispo. “Houve alturas em que me tentavam segurar e só o conseguiam
com alguma dificuldade. Por exemplo, lembro-me de um tio que me acompanhou ter
comentado que era impossível eu ter tanta
força”, diz Aldina Cardeal à SÁBADO.
Noutras
situações, a professora, hoje com 35 anos, percebia que falava com uma voz
diferente. “Num instante falava eu e no outro era o Demónio que falava. Isso só
me acontecia quando tinha ataques mais fortes”, afirma. Aldina diz ter agora
uma vida muito diferente da que tinha antes de ser exorcizada. Por exemplo,
deixou de ter dores físicas fortes. “O meu corpo ficava dolorido num espaço de
poucos minutos. Era como se de repente tivesse corrido várias horas”, descreve.
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