Arquivo do blogue

segunda-feira, 29 de julho de 2019


A PROFECIA DE DOM BOSCO E A TERCEIRA HUMANIDADE

 
Dom Bosco, SDB, foi um sacerdote católico italiano, fundador da Pia Sociedade São Francisco de Sales e proclamado santo em 1934. Nasceu Giovanni Melchior Bosco e foi aclamado por Paulo II como o "Pai e Mestre da Juventude". Dom Bosco é o padroeiro da capital federal do Brasil, Brasília.

 


 

Desde as primeiras navegações, as novas terras de além-mar começaram a despertar o interesse de vários países que já possuíam uma esquadra marítima capaz de atravessar o mar ocidental. Este foi o caso dos espanhóis, dos portugueses, dos franceses, dos holandeses e dos ingleses, que começaram a utilizar a nova rota marítima para tentar estabelecer a exploração e a colonização das novas terras descobertas. Comentava-se, na Europa, que as terras recém-descobertas de além-mar eram, na verdade, um novo continente e não a Ásia, como Colombo havia acreditado a princípio. Depois das primeiras travessias ao longo do mar ocidental, o percurso passou a ser mais confiável, despertando um interesse maior dos países europeus, que, a partir de então, poderiam explorar as terras recém-descobertas e também expandirem-se territorialmente, de modo que os navegadores começaram a fazer esta travessia com mais frequência. Em virtude disso, a partir de 1530, os portugueses começaram a chegar ao Brasil para explorar o pau-brasil e para cultivar a cana-de-açúcar.

 
Somente no século XVI chegaram cerca de 200 mil europeus ao novo continente, estabelecendo-se nas terras recém-descobertas. Entre o século XVI e o século XVIII cerca de 100.000 portugueses deslocaram-se para o Brasil. Muitos destes colonizadores passavam por dificuldades financeiras na Europa e, por isso, procuravam alguma oportunidade no novo continente através da aquisição de sesmarias (A Lei das Sesmarias foi uma legislação do reinado de Fernando I de Portugal. Foi promulgada em Santarém a 28 de Maio de 1375, e insere-se num contexto de crise económica que se manifestava há já algumas décadas por toda a Europa e que a peste negra agravou. Assim, toda a segunda metade do século XIV e quase todo o século XV foram períodos de depressão. A peste negra levou a uma falta inicial de mão-de-obra nos centros urbanos (locais onde a mortandade foi ainda mais intensa) que, por sua vez, desencadeou o aumento dos salários das actividades artesanais. Estes factos desencadearam a fuga dos campos para as cidades. Após estas consequências iniciais verificou-se, e tornou-se característica deste período, a falta de mão-de-obra rural que levou à diminuição da produção agrícola e ao despovoamento de todo o país). Neste período inicial, dedicaram-se principalmente à agricultura baseada no trabalho escravo, efectuado a princípio por indígenas (Índios), que não demonstraram ser mão-de-obra adequada para estes fins. Desta maneira, os colonizadores passaram a buscar os negros, em África, para trabalharem como mão-de-obra escrava nos engenhos. Admite-se o ingresso no Brasil de cerca de 75. 000 negros para o século XVI, e 452. 000 para o século XVII.

A mistura entre os nativos indígenas, os europeus e os negros africanos formou um novo tipo humano: “O primeiro brasileiro consciente de si foi, talvez, o mameluco, esse brasilíndio mestiço na carne e no espírito, que não podendo identificar-se com os que foram seus ancestrais americanos – que ele desprezava, nem com os europeus que o desprezavam e sendo ele objecto de mofa dos reinóis e dos luso-nativos, via-se condenado à pretensão de ser o que não era nem existia: o brasileiro” (Ribeiro, 1995).

 

Muitos grupos étnicos, que foram arrancados de suas terras de origem, foram destinados a trabalhar nas regiões das Minas Gerais, Mato Grosso e Goiás, onde foram encontradas enormes jazidas de ouro. A descoberta e a exploração do ouro nestas regiões começaram a atrair gente de todos os lugares, que procuravam enriquecer facilmente, ou tentavam encontrar alguma condição de trabalho e de comércio mais favorável. Foi assim que surgiram várias cidades nestas regiões que se desenvolveram com rapidez, tanto cultural como urbanisticamente. A cidade de Vila Rica, actual Ouro Preto, surgiu desta maneira e adquiriu rapidamente um carácter urbano, tornando-se um importante centro intelectual e cultural da época. Foi na Vila Rica do século XVIII que os Inconfidentes organizaram o movimento que ficou conhecido como Inconfidência Mineira, a qual foi dissolvida com braço de ferro pela coroa Portuguesa.

 

                                                                                                                                                                                                                              
No século XIX, foram trazidos mais 2.204.000 negros ao Brasil para trabalharem em regime de mão-de-obra escrava. O que soma um total de cerca de 6.352.000 escravos negros que ingressaram no país, entre 1540 e 1860. Somente após a abolição da escravatura, em 1888, o governo passou a incentivar a entrada de imigrantes europeus no território brasileiro. Nos séculos XIX e XX as situações política e social da Europa agravaram-se, assim como em outras regiões do mundo, produzindo uma grande leva de emigrantes, que teriam como destino as Américas. O Brasil precisava de mão-de-obra para substituir os escravos que haviam sido libertados pela Lei Áurea. Era necessário receber vários contingentes étnicos para desenvolver a agricultura, para trabalhar nas indústrias do sul do país ou para ocupar e desenvolver o imenso território nacional. Isto resultou numa grande emigração europeia para a América do Sul, que num primeiro momento foi de espanhóis e de portugueses, que desembarcaram e se estabeleceram em várias regiões do continente.

A partir de 1824, começaram a chegar ao Brasil, alemães, italianos, ucranianos, polacos e russos, que passaram a integrar a população juntamente com os grupos indígenas e africanos que já compunham o contingente nacional. Formado a partir das matrizes indígenas, europeia, africana e eslava, a etnia nacional passou a caracterizar-se como um povo-novo de formação multicultural e multirracial. Ocorreu, então, o processo de aculturação e de miscigenação, produzindo, assim, um novo tipo humano, que continuou a misturar-se com as novas levas de imigrantes que continuavam a chegar ao continente. Os novos contingentes humanos, que pertenciam às várias regiões do mundo, estabeleceram-se na região e continuaram a estimular o processo de contínua aculturação e miscigenação entre as diversas etnias que viviam no ambiente comum do território Sul-Americano. Muitos povos que viviam em regime de perseguições, como os judeus e os arménios, também decidiram partir para a América do Sul, que acolhia gente de todas as partes do mundo. Estes imigrantes encontraram condições melhores que as que tinham nos seus próprios países. De facto encontraram liberdade religiosa, a aceitação dos seus costumes e das suas tradições, assim como as condições climáticas e sociais para desenvolverem os mais variados tipos de actividades.

Vários povos do Médio Oriente também começaram a chegar, tanto cristãos como muçulmanos, representados principalmente pelos sírios libaneses, que se fixaram no Brasil, Uruguai, Argentina e Paraguai. Os imigrantes turcos e árabes fixaram-se principalmente nas médias e nas grandes cidades e também na região amazónica, onde desenvolveram as suas actividades comerciais e encontraram boas oportunidades para prosperarem economicamente. Também chegaram à América do Sul numerosos contingentes de japoneses, chineses e, também, indianos. As imigrações de alemães e de italianos diminuíram de ritmo durante o período da Primeira Guerra Mundial. Entretanto, cresceu a imigração dos povos minoritários, como os polacos, os ucranianos e os arménios. A partir de 1908, iniciou-se uma expressiva imigração japonesa para o Brasil, que, contudo, retrocedeu no início da Segunda Guerra Mundial. Este processo foi retomado, em menor escala, após a guerra, época em que começaram a chegar os primeiros imigrantes coreanos, que aumentaram em número após 1939. O contingente imigratório integrado na população brasileira até 1959 foi composto principalmente por 1,7 milhões de imigrantes portugueses que vieram a juntar-se com os portugueses dos primeiros séculos, assim como 700 mil espanhóis, 1,6 milhões de italianos, cerca de 250 mil alemães, 230 mil japoneses, 190 mil sírios e turcos, e 600 mil entre os eslavos e os vários contingentes menores de outras etnias. Depois de 1959, o continente continuou a receber os contingentes imigratórios de várias regiões do mundo, que desta maneira também passaram a integrar-se na, já miscigenada, etnia continental. Sendo que, as raças indígenas remanescentes, que não foram dizimadas pelas invasões do seu território nem pelas doenças trazidas pelos europeus, e que sobreviveram como grupos, continuaram a compor a população juntamente com os contingentes imigratórios que se estabeleceram no continente, produzindo, assim, um contínuo processo de aculturação e miscigenação, formando, desse modo, um novo tipo humano de conformação multirracial e multicultural, que o caracteriza como um povo novo, o qual se integrou pelas matrizes linguísticas espanhola e portuguesa no continente Latino-Americano.

A ideia da mudança da capital do Brasil para o interior do seu território principiou-se no fim do século XVIII, quando os Inconfidentes incluíram esta intenção no seu programa. Os Inconfidentes pretendiam enfraquecer o jugo da metrópole e, por meio desta manobra, estabelecer a sua nova sede numa das províncias do interior. No entanto, a Coroa portuguesa reagiu energicamente e dissolveu estas intenções aniquilando sem piedade o movimento Inconfidente. A cidade do Rio de Janeiro havia sido elevada à condição de capital da colónia, no ano de 1763. Em virtude disso, crescia a sua importância política e administrativa perante a Coroa portuguesa, projectando-se como principal centro urbano da colónia. Em 1808, foi realizada a transferência da corte portuguesa para o Rio de Janeiro, por conta das guerras desencadeadas por Napoleão I, na Europa. Alguns anos depois, em 1815, o Brasil foi elevado à categoria de Reino, em igualdade de condições com Portugal, e as suas capitanias passaram a chamar-se províncias.

 

A ideia de interiorizar a capital do Império passou a ser discutida por alguns homens de relevo no cenário político, os quais começaram a sentir a importância de transferi-la para o centro do território, em virtude de que ela se situar na região litoral do Rio de Janeiro. Em 1821, o naturalista, poeta, estadista e futuro Patriarca da Independência do Brasil, José Bonifácio de Andrada e Silva, escreveu as suas Ideias Sobre a Organização Política do Brasil, na qual cita a necessidade de criar uma cidade no interior do Brasil para assento da Regência, que poderia ser a 15 graus de latitude. Em 20 de Outubro de 1821, José Bonifácio redige, novamente, as mesmas ideias nas Instruções do Governo Provisório de São Paulo aos Deputados às Cortes de Portugal, apresentadas ao Príncipe Regente Dom Pedro de Alcântara, em 9 de Novembro de 1821, por António de Almeida Andrada. José Bonifácio de Andrada e Silva redigiu a seguinte instrução: “Parece-nos muito útil que se levante uma cidade central no interior do Brasil para assento da Corte ou da Regência, que poderá ser na latitude de mais ou menos 15 graus, em sítio sadio, ameno, fértil e regado por algum rio navegável” (Silva, 1971). A predestinação desta região continuou a confirmar-se na noite de 30 de Agosto de 1883, quando Dom Bosco teve um longo e extraordinário sonho profético em que avistou, segundo as suas palavras, a “Terra Prometida, donde fluirá leite e mel, e será uma riqueza inconcebível”, sonho este que revelou alguns dias depois à Congregação Salesiana como sendo “um facto maravilhoso” (Silva, 1971).

Giovanni Melchior Bosco nasceu em Becchi, na Itália, em 16 de Agosto de 1815. Mais tarde passaria a ser conhecido como Dom Bosco, ou, também, como São João Bosco. Iniciou os seus estudos em escolas públicas e com a idade de dez anos começou a demonstrar que possuía o dom dos sonhos proféticos, que mais tarde revelaram-se como sendo extraordinárias experiências de natureza transcendental. Entrou para o seminário aos 16 anos, guiado por estas mesmas visões. Tornou-se o padre João Bosco, em 1841, quando começou a recolher e educar os jovens pobres e abandonados e a convidar os que estavam na prisão para que, quando saíssem, se dirigissem ao oratório. Assim se chamava o lugar onde o padre João Bosco reunia e educava os jovens a redescobrir a dignidade da própria vida como filhos de Deus. O oratório era um lugar onde havia salas de aula, campos para jogos, salas para oficinas, dormitório, um refeitório para os alunos internos e uma igreja para catequese, onde se praticava a oração e o canto devocional.

Dom Bosco estabeleceu o oratório de São Francisco de Sales, um ginásio e uma escola profissional num bairro de Turin, no ano de 1846. E fundou um Instituto para educação da juventude feminina, em 1855, com o apoio de Madre Maria Mazzarelo. Fundou, também, a Congregação Salesiana, juntamente com os seus colaboradores que passaram a chamar-se salesianos, em homenagem a São Francisco de Sales. A Congregação surgiu com um sacerdote, quinze seminaristas e um estudante. Dom Bosco modelou as primeiras gerações de salesianos. Compartilhou com eles as suas experiências, assim como também as suas visões proféticas, que muitas vezes se revelavam como extraordinárias experiências transcendentes. Foi por meio destas mesmas visões, que decorreram entre os anos de 1883 e 1886, que Dom Bosco passou a avistar o futuro da obra missionária que deveria realizar à frente dos salesianos na América do Sul, Ásia, África e Austrália. Os salesianos davam muita importância para estas visões de Dom Bosco e consideravam-nas como verdadeiras profecias.

Dom Bosco guiava-se por estas suas visões transcendentes, e foi desta forma que organizou onze expedições missionárias para a América do Sul. A primeira delas chegou a Buenos Aires, na Argentina, em 1875. Os salesianos teriam por missão atender os compatriotas emigrados neste país e evangelizar a Patagónia. Desse modo, estabeleceram-se na Argentina e no Uruguai e expandiram-se notavelmente num curto espaço de tempo. E, sob a orientação enérgica de Dom Bosco, conseguiram estabelecer-se na região inóspita da Patagónia, onde passaram a desenvolver o trabalho missionário da evangelização e da educação das tribos selvagens da região. A obra missionária de Dom Bosco, à frente dos salesianos, propunha aos seus membros serem solidários com o mundo e com a sua história, estarem abertos à cultura dos povos e às necessidades dos jovens dos ambientes populares, lutando pela justiça e pela paz, rejeitando tudo o que favorecesse a miséria, a injustiça, a violência e cooperando, sobretudo, com todos aqueles que construíam uma sociedade mais digna para o homem. Mais tarde, os salesianos organizaram-se e estabeleceram-se no Brasil, no Chile e no Equador, até 1888, na Colômbia, em 1890, no Peru, em 1891, no México, em 1892, na Venezuela, em 1894, na Bolívia e no Paraguai, em 1896, e nos Estados Unidos em 1897. A obra de Dom Bosco floresceu, e a Ordem Salesiana estendeu-se para 128 países nos cinco continentes.

Dom Bosco costumava reunir-se com a Congregação Salesiana para discutir os assuntos referentes às obras missionárias, que se expandiam cada vez mais, e durante a reunião do Capítulo Geral da Congregação, realizada em 4 de Setembro de 1883, Dom Bosco revelou que teve um "maravilhoso sonho profético" alguns dias antes, e que revelaria o conteúdo da sua extraordinária visão. Um sacerdote da Congregação ficou responsável por redigir as palavras de Dom Bosco, para que nada se perdesse. Dom Bosco disse, então, que foi arrebatado pelos anjos e "Por muitas milhas, percorremos uma enorme floresta virgem e inexplorada... Não só a descortinava, ao longo das cordilheiras, mas via até as cadeias de montanhas isoladas, existentes naquelas planícies imensuráveis, e as contemplava em todos os seus menores acidentes... Aquelas de Nova Granada, da Venezuela, das Três Guianas, as do Brasil, da Bolívia, até os últimos confins. Eu vi as entranhas das montanhas e o fundo das planícies. Tinha sob os olhos as riquezas incomparáveis desses países, as quais um dia serão descobertas... Mas não era tudo. Entre os paralelos 15 e 20 graus, havia um leito muito largo e muito extenso, que partia de um ponto donde se formava um lago. Então uma voz disse repetidamente: Quando se vierem a escavar as minas escondidas no meio destas montanhas, aparecerá a Terra Prometida, donde fluirá leite e mel. Será uma riqueza inconcebível. O Santo afirmou que os sonhos descritos seriam vividos na terceira geração" (Silva, 1971). A visão profética que Dom Bosco revelou como um "facto maravilhoso" à Congregação Salesiana, em 1883, indicava o futuro surgimento da "Terra Prometida, donde fluirá leite e mel. Entre os paralelos 15 e 20 graus". Esta era a mesma região que já havia sido antevista, no ano de 1821, pelo ilustre tribuno José Bonifácio de Andrada e Silva quando propôs "Criar uma cidade no interior do Brasil para assento da Corte, ou da Regência, que poderá ser em 15 graus de latitude, em sítio sadio, fértil e junto a algum rio navegável" (Silva, 1971).

Dom Bosco foi canonizado, na Páscoa de 1934, pelo Papa Pio XI. A partir deste momento, passou a ser oficialmente considerado um santo - São João Bosco. As suas visões proféticas revelaram-se como verdadeiras com o passar do tempo, como demonstram as obras missionárias dos salesianos, nos cinco continentes, que foram orientadas por estas visões proféticas. Foi desta maneira que a profecia mais importante de Dom Bosco, que fala sobre a “Terra Prometida donde fluirá leite e mel, que será uma riqueza inconcebível, e que surgirá entre os paralelos 15 e 20 graus”, permaneceu inabalável por mais de um século.

Inúmeras averiguações, estudos e trâmites burocráticos foram realizados desde o ano de 1821, época em que José Bonifácio apontou o paralelo 15 graus como a região mais apropriada para o assento da Corte ou da Regência, a mesma região que a extraordinária visão profética de Dom Bosco revelou, no ano de 1883. No entanto, foi somente no ano de 1955, quando realizava um comício em Goiás, que o então candidato à Presidência da  República, Juscelino Kubitschek , declarou que, se eleito, cumpriria o que estava determinado pela constituição e realizaria a transferência da capital federal para o paralelo 15 graus.

Juscelino Kubitschek disputou e venceu as eleições, tornando-se o Presidente da República Federativa do Brasil, em 3 de Outubro de 1955. E tomou posse do cargo em 31 de Janeiro de 1956, com o objectivo de construir a cidade de Brasília e transferir a capital da República para o planalto central. J. Kubitschek conhecia perfeitamente a profecia de Dom Bosco, como demonstra este pequeno excerto do seu livro Por que Construí Brasília: “O santo de Becchi, na Itália, era dado a visões, que constituíam verdadeiras antecipações do que iria acontecer no futuro, às vezes remoto. A 30 de Agosto de 1883, passou ele por outra experiência deste género. Tratava-se de um sonho-visão – e desta vez referente ao Brasil – relatado numa reunião do Capítulo Geral da sua Congregação alguns dias depois, ou seja, a 4 de Setembro. Dom Bosco revelou que foi arrebatado pelos anjos e, durante a viagem, um dos guias celestiais disse-lhe de repente: Olhai. Viajamos em direcção das cordilheiras. O santo relatou, então, que viu as selvas Amazónicas, com os seus rios intrincados e  enormes... E o santo prosseguiu a sua narrativa: Entre os paralelos 15 e 20 graus havia um leito muito largo e muito extenso, que partia de um ponto onde se formava um lago. Então uma voz lhe disse repetidamente: Quando escavarem as minas escondidas no meio destes montes, aparecerá aqui a Grande Civilização, a Terra Prometida, onde correrá leite e mel. Será uma riqueza inconcebível. E essas coisas acontecerão na terceira geração. Quando li essas palavras nas suas Memórias Biográficas, não deixei de me emocionar. Meditei sobre a Grande Civilização que iria surgir entre os paralelos 15 e 20 graus – justamente a área em que estava a construir, naquele momento, Brasília. O lago da visão do santo, já figurava no Plano-Piloto do urbanista Lúcio Costa. E a Terra Prometida, anunciada repetidamente, pela misteriosa voz, ainda não existia de facto, mas já se configurava através de um anseio colectivo, que passara a constituir uma aspiração nacional. Ali, correria leite e mel”.

A transferência da capital federal do Brasil para a região situada no paralelo 15 graus poderia finalmente proporcionar o desenvolvimento nacional de forma harmónica pelo despertar das forças vivas da nação, resultando no florescimento e na vivificação do território brasileiro, em benefício de toda a sociedade nacional. De modo que, após mais de 150 anos de discussões e de estudos, a cidade assinalada de Brasília seria finalmente estabelecida sobre o paralelo 15 graus, conforme a proposta realizada por José Bonifácio de Andrada e Silva no ano de 1821, e segundo a visão profética de Dom Bosco, revelada em 1883. E, como havia chegado o momento da edificação da cidade assinalada sobre o paralelo 15 graus, começaram a chegar milhares de operários de todas as partes do país, que passariam a ser chamados de candangos. O planeamento urbanístico da cidade assinalada de Brasília ficou a cargo do urbanista Lúcio Costa, auxiliado pelo arquitecto Oscar Niemayer. Lúcio Costa baptizou a nova capital federal do Brasil em um projecto urbanístico que, segundo ele, “Nasceu de um simples gesto com que se assinala um lugar, ou dele se toma posse. Dois eixos cruzando-se em ângulo recto, ou seja o próprio sinal da Cruz” (Silva, 1971).

 

No dia 2 de Outubro de 1956, iniciaram-se as obras da construção de Brasília,  quando o Presidente da  República , Juscelino Kubitschek, pronunciou as seguintes palavras: “Deste Planalto Central, desta solidão que em breve se transformará em cérebro das altas decisões nacionais, lanço os olhos mais uma vez sobre o amanhã do meu país e antevejo esta alvorada, com fé inquebrantável e uma confiança sem limites no seu grande destino”. (Silva, 1971). Nesta época, as mercadorias que saíam do Rio de Janeiro e de São Paulo demoravam cerca de seis meses para chegar a Porto Velho, no estado de Randónia. Era necessário construir uma capital que interligasse as diversas regiões e cidades do vasto território nacional. No livro Por que Construí Brasília  Juscelino Kubitschek escreve sobre uma das suas estratégias para consolidar o seu ideal da integração da unidade nacional: “A jornada de integração começara em Brasília. Era forçoso unir o país por dentro, rasgando, enfim, o cruzeiro rodoviário, que iria ligar, uns aos outros, os quatro pontos cardeais do território nacional”. Desse modo, a cidade de Brasília serviria como um pólo de comunicação entre os estados e as cidades brasileiras, que se interligariam, através de uma ampla malha rodoviária, com a nova capital federal. A cidade de Brasília interligaria os estados e as cidades do território nacional através de estradas pavimentadas ao longo de uma distância de 1.160km do Rio de Janeiro, 716km de Belo Horizonte, 1.015km de São Paulo, 2.021km de Porto Alegre, 1.147km de Cuiabá, 3.033km de Rio Branco, 3.421km de Manaus, 2.120km de Belém, 2.579km de Natal, e 4.275km de Boa Vista.

 

Nos dias 20 e 21 de Abril de 1960, aconteceram as festividades da transferência da capital federal, que se situava na cidade do Rio de Janeiro, para a cidade assinalada de Brasília, que foi edificada sobre o paralelo 15 graus, região localizada no planalto central brasileiro. Nesta ocasião, Juscelino Kubitschek discursou: “Com o pensamento na Cruz em que foi celebrado o Santo Sacrifício, peço ao Criador que mantenha cada vez mais coesa a unidade nacional, que nos dê sempre esta atmosfera de paz, indispensável ao trabalho fecundo e conserve em vós, obreiros de Brasília, o mesmo espírito forte com que erguestes a Grande Cidade” (Silva, 1971).

A construção e a transferência da capital da República Federativa do Brasil somente foi possível graças ao anseio e o esforço de muitos homens, que acreditaram na integração e na unidade nacional desde a Inconfidência Mineira. A capital federal do Brasil – a cidade assinalada - foi antevista, em 1821, pelo génio do Patriarca da Independência José  Bonifácio de Andrada e Silva, foi prenunciada, em 1883, pela extraordinária visão profética de Dom Bosco, foi confirmada posteriormente pelos estudos e pelas discussões que apontaram a necessidade nacional da construção e da transferência da capital federal, e a sua construção foi realizada entre os anos de 1956 e 1960, no mandato do Presidente da República, Juscelino Kubitschek.

A capital da República Federativa do Brasil surgiu, desta maneira, como uma cidade assinalada pelo destino, estabelecendo-se sobre o paralelo 15 graus, região que congrega todos os povos mais importantes do mundo, em que, segundo a visão profética de São João Bosco, florescerá a “Terra Prometida, donde fluirá leite e mel e será uma riqueza inconcebível”.

 

(Texto sem adopção às regras do acordo ortográfico de 1990. R)

 

sexta-feira, 26 de julho de 2019


A LIGAÇÃO NAZI COM SHAMBHALA E TIBETE

Alexander Berzin
Maio de 2003

 
Este artigo do Dr. Alexander Berzin dá-nos uma perspectiva da formação ocultista das SS de Hitler. Os membros das SS eram enquadrados e mentalizados como verdadeiros monges guerreiros de uma sociedade secreta. A parte visível desta organização não revelava a seita tenebrosa e implacável que marcou o destino da Alemanha, a não ser a sua disciplina cega aos seus líderes.

(Tradução minha para português de Portugal, sem adopção às regras do acordo ortográfico de 1990, com algumas imagens tiradas da Net para o texto não ficar tão denso, e sem alterar o sentido do texto original, que poderá ser consultado no site. R)


Introdução


 
 

Muitos membros superiores do regime nazi, incluindo Hitler, mantinham crenças ocultas bizantinas. Entre 1938 e 1939, impelidos por essas crenças, os alemães enviaram uma expedição oficial ao Tibete, a convite do governo tibetano, para assistir às celebrações do Losar (Ano Novo).

O Tibete tinha sofrido uma longa história de tentativas de anexação pelos chineses e de falhas britânicas de prevenir a agressão ou proteger o Tibete. Sob Stalin, a União Soviética perseguiu severamente o budismo, especificamente a forma tibetana praticada entre os mongóis dentro das suas fronteiras e do seu satélite, a República Popular da Mongólia (Mongólia Exterior). Pelo contrário, o Japão apoiava o budismo tibetano na Mongólia Interior, que tinha anexado como parte de Manchukuo, o seu estado-fantoche na Manchúria. Alegando que o Japão era Shambhala, o governo imperial tentava ganhar o apoio dos mongóis, sob o seu domínio, para uma invasão da Mongólia Exterior da Sibéria com o propósito de criar uma confederação pan-mongol, sob a protecção japonesa.

 


 
O governo tibetano explorava a possibilidade de também obter a protecção do Japão face à situação instável. O Japão e a Alemanha tinham assinado um Pacto Anti-Commintern, em 1936, declarando a sua hostilidade mútua em relação à propagação do comunismo internacional. O convite para a visita de uma delegação oficial da Alemanha Nazi foi prolongado neste contexto. Em Agosto de 1939, logo após a expedição alemã ao Tibete, Hitler quebrou o seu pacto com o Japão e assinou o Pacto Nazi-Soviético. Em Setembro, os soviéticos derrotaram os japoneses que tinham invadido, em Maio, a Mongólia Exterior. Subsequentemente, dos contactos japoneses e alemães com o governo tibetano nada se veio a materializar.

[Para mais pormenores, veja: O Envolvimento Russo e Japonês com o Tibete Pré-Comunista: O papel da Lenda de Shambala.]

Vários escritores sobre o oculto do pós-guerra afirmaram que o budismo e a lenda de Shambhala desempenharam um papel no contacto oficial entre a Alemanha e o Tibete. Vamos examinar essa questão.

Os mitos de Thule e Vril


O primeiro elemento das crenças ocultistas nazis era o reino mítico de Hiperbórea-Thule. Assim como Platão citou a lenda egípcia da ilha afundada de Atlântida, Heródoto mencionou a lenda egípcia do continente Hiperbórea no norte distante. Quando o gelo destruiu esta terra antiga, o seu povo emigrou para o sul. Escrevendo em 1679, o autor sueco Olaf Rudbeck identificou o povo da Atlântida como hiperbóreos e situou este último no pólo norte. De acordo com várias narrativas, a Hiperbórea dividiu-se nas ilhas de Thule e Ultima Thule, que algumas pessoas identificaram com a Islândia e a Gronelândia.

O segundo ingrediente era a ideia de uma terra oca. No fim do século XVII, o astrónomo britânico Sir Edmund Halley sugeriu pela primeira vez que a terra era oca, consistindo em quatro esferas concêntricas. A teoria da terra oca excitou as imaginações de muitas pessoas, especialmente com a publicação, em 1864, da Viagem ao Centro da Terra do novelista francês Júlio Verne.



Depressa o conceito de vril apareceu. Em 1871, o novelista britânico Edward Bulwer-Lytton, em A Raça Futura, descreveu uma raça superior, os Vril-ya, que viviam debaixo da terra e planeavam conquistar o mundo com vril, uma energia psicocinética. O autor francês Louis Jacolliot promoveu o mito em Os Filhos de Deus (1873) e em As Tradições Indo-Europeias (1876). Nestes livros, ele ligou o vril com o povo subterrâneo de Thule, que irá aproveitar o poder de vril para se transformar em super-homens e dominar o mundo.

O filósofo alemão Friedrich Nietzsche (1844-1900) também enfatizou o conceito de Übermensch (super-homem) e começou o seu trabalho, Der Antichrist (O Anticristo) (1888) com a frase, “Olhemo-nos face a face. Somos hiperbóreos. Sabemos bastante bem que vivemos fora dessa trilha”. Embora Nietzsche nunca mencionasse o vril, contudo, na sua colecção de aforismos publicada postumamente, Der Wille zur Macht (A Vontade de Poder), ele enfatizou o papel de uma força interior no desenvolvimento super-humano. Escreveu que “o rebanho”, significando as pessoas comuns, busca segurança dentro de si mediante a criação da moral e de regras, enquanto que os super-homens têm uma força vital interior que os leva além do rebanho. Essa força necessita e leva-os a mentir ao rebanho por forma a permanecerem independentes e livres da “mentalidade do rebanho”.



Em The Arctic Home of the Vedas (1903), um dos primeiros defensores da liberdade indiana, Bal Gangadhar Tilak, deu mais um toque ao identificar a emigração dos Thuleanos para o sul com a origem da raça ariana. Assim, muitos alemães no início do século XX acreditavam que eram os descendentes dos arianos que tinham emigrado da Hiperbórea-Thule para o sul e que estavam destinados a tornarem-se a raça mestra dos super-homens através do poder de vril. Hitler era um deles.

A Sociedade de Thule e a fundação do Partido Nazi


Felix Niedner, o tradutor alemão das Eddas em nórdico antigo, fundou a Sociedade de Thule em 1910. Em 1918, Rudolf Freiherr von Sebottendorff estabeleceu a sua filial em Munique. Sebottendorf tinha previamente vivido durante vários anos em Istambul onde, em 1910, tinha formado uma sociedade secreta que combinava o sufismo esotérico com a Maçonaria Livre. Acreditavam no credo dos assassinos, derivado da seita islâmica ismaelita Nazari, que tinha florescido durante as Cruzadas. Durante a sua estadia em Istambul, Sebottendorf também esteve indubitavelmente ligado ao movimento pan-Turaniano (pan-Túrquico) dos Jovens Turcos, iniciado em 1908, que esteve por trás do genocídio arménio de 1915-1916. A Turquia e a Alemanha eram aliadas durante a Primeira Guerra Mundial. De regresso à Alemanha, Sebottendorff também foi membro da Ordem Germânica [Germanen] (Ordem dos Teutões), fundada em 1912, como uma sociedade de direita, incluindo um secreto grupo anti-semítico. Através destes canais, o assassinato, o genocídio e o anti-semitismo tornaram-se partes do credo da Sociedade de Thule. O anti-comunismo foi adicionado após a revolução comunista Bavariana, mais tarde em 1918, quando a Sociedade Thule de Munique se tornou o centro do movimento contra-revolucionário.

Em 1919, a sociedade criou o Partido Alemão dos Trabalhadores. Começando mais tarde, nesse ano, Dietrich Eckart, um membro do círculo mais restrito da Sociedade de Thule, iniciou Hitler na sociedade e começou a treiná-lo nos seus métodos para utilizar o poder de vril para a criação de uma raça ariana de super-homens. Hitler teve uma inclinação para o misticismo desde a sua juventude, quando estudou o Oculto e a Teosofia em Viena. Mais tarde, Hitler dedicou o Mein Kampf a Eckart. Em 1920, Hitler tornou-se líder do Partido Alemão dos Trabalhadores, renomeando-o então para Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães (Partido Nazi).

Haushofer, a Sociedade Vril e a Geopolítica


Outra influência principal no pensamento de Hitler foi Karl Haushofer (1869-1946), um conselheiro militar alemão junto dos japoneses após a Guerra Russo-Japonesa de 1904-1905. Porque estava extremamente impressionado com a cultura japonesa, muitos acreditam que ele foi responsável pela posterior aliança Alemã-Japonesa. Ele também estava muito interessado na cultura indiana e tibetana, aprendeu sânscrito, e afirmava que tinha visitado o Tibete.

Após ter servido como general na Primeira Guerra Mundial, Haushofer fundou a Sociedade Vril, em Berlim, em 1918. Partilhava as mesmas crenças básicas que a Sociedade de Thule, e dizem que era o seu círculo mais restrito. A Sociedade procurou contactar seres sobrenaturais debaixo da terra para deles obter os poderes de vril. Afirmou também que a raça ariana tinha tido origem na Ásia central. Haushofer desenvolveu a doutrina da Geopolítica e, nos finais da década de 1920, tornou-se director do Instituto de Geopolítica da Universidade Ludwig-Maximilians, em Munique. A geopolítica advogava a conquista de territórios, para obter mais espaço vital (Alemão: Lebensraum), como um instrumento de obtenção de poder.

Rudolf Hess era um dos estudantes mais próximos de Haushofer e, em 1923, levou-o junto a Hitler quando este estava preso devido ao seu golpe de estado falhado. Posteriormente, Haushofer visitou o futuro Führer com frequência, ensinando-lhe geopolítica em associação com as ideias das sociedades de Thule e Vril. Assim, quando Hitler se tornou chanceler em 1933, adoptou a geopolítica como a sua política a fim de a raça ariana conquistar a Europa Oriental, a Rússia e a Ásia central. A chave para o sucesso seria encontrar os antepassados da raça ariana na Ásia central, os protectores dos segredos de vril.

A Suástica



A suástica é um antigo símbolo indiano de boa sorte imutável. “Suástica” é um aportuguesamento da palavra sânscrita svastika, que significa o bem-estar ou a boa sorte. Usada por hindus, budistas e jainistas durante milhares de anos, também se tornou difundida no Tibete.

A suástica também apareceu na maioria das outras culturas antigas do mundo. Por exemplo, a sua variação anti-horário (no sentido contrário à direcção em que os ponteiros do relógio se movem), adoptada pelos nazis, também é a letra “G” no sistema de escrita rúnico medieval, do norte da Europa. Os Mações Livres tomaram a letra como um símbolo importante, dado que “G” poderia representar God (Deus), o Grande arquitecto do universo, ou a Geometria.

A suástica também é o símbolo tradicional de Thor, o Deus nórdico dos Relâmpagos e do Poder (Thor em escandinavo, Donner em alemão, Perkunas em Báltico). Por causa desta associação com o Deus dos Relâmpagos, os letões e os finlandeses tomaram a suástica como insígnia para as suas forças aéreas, quando se tornaram independentes depois da Primeira Guerra Mundial.

Nos finais do século XIX, Guido von List adoptou a suástica como emblema para o movimento Neo-Pagão da Alemanha. No entanto, os alemães não usaram a palavra sânscrita suástica, mas em vez disso chamaram-na “Hakenkreutz”, significando “cruz enganchada”. Derrotaria e substituiria a cruz, assim como o neo-paganismo derrotaria e substituiria o cristianismo.

Compartilhando o sentimento anti-cristão do movimento neo-pagão, a Sociedade de Thule também adoptou a cruz enganchada como parte do seu emblema, colocando-o num círculo com um punhal alemão vertical nele sobreposto. Em 1920, por sugestão do Dr. Friedrich Krohn, da Sociedade de Thule, Hitler adoptou a cruz enganchada num círculo branco como símbolo central da bandeira do Partido Nazi. Hitler escolheu o vermelho para cor de fundo a fim de competir contra a bandeira vermelha do Partido Comunista rival.

Os investigadores franceses Louis Pauwels e Jacques Bergier, em Le Matin des Magiciens (O Despertar dos Mágicos) (1962), escreveram que Haushofer convenceu Hitler a usar a cruz enganchada como símbolo do Partido Nazi. Eles postularam que isso foi devido ao interesse de Haushofer pela cultura indiana e tibetana. Esta conclusão é muitíssimo improvável, dado que Haushofer só conheceu Hitler em 1923, e uma vez que a bandeira nazi apareceu pela primeira vez em 1920. É mais provável que Haushofer tivesse usado a presença da suástica, difundida na Índia e no Tibete, como evidência para convencer Hitler de que esta região era o local dos antepassados da raça ariana.

Supressão dos Grupos Ocultistas Rivais pelos Nazis


Durante a primeira metade da década de 1920, uma rivalidade violenta ocorreu, na Alemanha, entre as Sociedades Ocultas e as Lojas Secretas. Em 1925, por exemplo, Rudolf Steiner, o fundador do Movimento Antroposófico, foi encontrado assassinado. Muitos suspeitaram que a Sociedade de Thule tivesse ordenado o seu assassinato. Anos mais tarde, Hitler continuou a perseguição aos Antroposofistas, aos Teosofistas, aos Mações Livres e aos Rosacruzes. Vários eruditos atribuem esta política ao desejo de Hitler eliminar quaisquer rivais ocultistas ao seu poder.


Influenciado pela escrita de Nietszche e pela doutrina da Sociedade de Thule, Hitler acreditava que o cristianismo era uma religião imperfeita e pervertida nas suas raízes pelo pensamento judaico. Via os seus ensinamentos sobre o perdão, o triunfo dos fracos, e a auto-abnegação como anti-evolucionários e via-se a si próprio como um Messias, substituindo Deus e Cristo. Steiner tinha usado a imagem do Anticristo e de Lúcifer como futuros líderes espirituais que iriam regenerar o cristianismo numa nova e pura forma. Hitler foi muito mais longe. Viu-se a si próprio como livrando o mundo de um sistema degenerado e criando uma nova etapa na evolução da raça mestra ariana. Não tolerava nenhum Anticristo rival, nem agora nem no futuro. No entanto, era tolerante quanto ao budismo.

O Budismo na Alemanha Nazi


Em 1924, em Frohnau, Berlim, Paul Dahlke fundou a Buddhistischen Haus (Casa para Budistas). Estava aberta a membros de todas as tradições budistas, mas apoiava principalmente as tradições Theravada e japonesa, visto que eram naquela época as mais amplamente conhecidas no ocidente. Em 1933, alí se realizou o primeiro Congresso Budista Europeu. Os nazis permitiram que a Casa para Budistas permanecesse aberta durante a guerra, mas controlavam-na firmemente. Como alguns membros sabiam chinês e japonês, agiam como tradutores para o governo em troca da tolerância ao budismo.

Embora o regime nazi tivesse fechado a Buddhistische Gemeinde (Sociedade Budista) em Berlim, activa desde 1936, e prendido por pouco tempo, em 1941, o seu fundador Martin Steinke, por regra não perseguiam os budistas. Depois de ser libertado, Steinke e outros continuaram a ensinar o budismo em Berlim. Não há nenhuma prova, no entanto, de qualquer presença de professores de budismo tibetano no terceiro Reich.

A política nazi de tolerância ao budismo não prova qualquer influência de ensinamentos budistas a Hitler ou à ideologia nazi. Uma explanação mais provável seria a Alemanha não pretender prejudicar as relações com o seu aliado budista, o Japão.

O Ahnenerbe


Sob a influência de Haushofer, Hitler autorizou Frederick Hielscher, em 1935, a estabelecer o Ahnenerbe (Departamento para o Estudo da Herança Ancestral, um ramo das SS, dedicado principalmente à pesquisa de provas da superioridade da raça ariana) com o coronel Wolfram von Sievers como director. Entre outras funções, Hitler encarregou-o de pesquisar runas germânicas e as origens da suástica, e situar a origem da raça ariana. Tibete era o candidato mais prometedor.



Alexander Csoma de Körös (Körösi Csoma Sandor) (1784-1842) era um erudito húngaro obcecado pela busca das origens do povo húngaro. Com base nas afinidades linguísticas entre o húngaro e as línguas turcomanas (ou túrquicas), achava que as origens do povo húngaro se encontravam no “reino de Yugurs (Uighurs)”, no Turquestão Oriental (Xinjiang, Sinkiang). Ele acreditava que se conseguisse chegar a Lhasa, lá iria encontrar as chaves para localizar a sua terra de origem.

O húngaro, o finlandês, as línguas turcomanas (ou túrquicas), o mongol e o manchu pertencem à família das línguas uralo-altaicas, também conhecidas como a família turaniana, da palavra persa Turan para Turquestão. A partir de 1909, os turcos tiveram um movimento pan-turaniano liderado por uma sociedade conhecida como os Jovens Turcos. Em 1910, a Sociedade Turaniana Húngara depressa a seguiu e, em 1920, o mesmo aconteceu com a Aliança Turaniana da Hungria. Alguns eruditos acreditam que as línguas japonesa e coreana também pertencem à família turaniana. Assim, em 1921, a Aliança Nacional Turaniana foi fundada no Japão e, nos finais da década de 1930, a Sociedade Turaniana Japonesa. Haushofer estava sem dúvida ciente destes movimentos, que procuravam as origens da raça turaniana na Ásia central. Encaixava bem com a Sociedade de Thule que também lá procurava as origens da raça ariana. O seu interesse pela cultura tibetana deu um peso adicional à candidatura do Tibete como chave para a descoberta de uma origem comum para as raças arianas e turanianas e para a obtenção do poder de vril que os seus líderes espirituais possuíam.

Haushofer não era a única influência no interesse de Ahnenerbe pelo Tibete. Hielscher era amigo de Sven Hedin, o explorador sueco que tinha conduzido expedições ao Tibete em 1893, em 1899-1902 e em 1905-1908, e uma expedição à Mongólia em 1927-1930. Favorito dos nazis, Hitler convidou-o a pronunciar o discurso de abertura dos Jogos Olímpicos de Berlim, em 1936. Hedin envolveu-se na Suécia em actividades de propaganda pró-nazi e fez numerosas missões diplomáticas à Alemanha entre 1939 e 1943.

Em 1937, Himmler transformou o Ahnenerbe numa organização oficial associada às SS (Alemão: Schutzstaffel, Equipa de Protecção) e seleccionou o professor Walther Wüst, presidente do Departamento de Sânscrito da Universidade de Ludwig-Maximilians, em Munique, como seu novo director. O Ahnenerbe teve um Tibet Institut (Instituto do Tibete), que foi renomeado de Sven Hedin Institut für Innerasien und Expeditionen (Instituto de Sven Hedin para Ásia Interior e Expedições) em 1943.

A Expedição Nazi ao Tibete


Ernst Schäfer, um caçador e biólogo alemão, participou em duas expedições ao Tibete, em 1931-1932 e 1934-1936, para desporto e pesquisa zoológica. O Ahnenerbe patrocinou-o para liderar uma terceira expedição (1938-1939) face ao convite oficial do governo tibetano. A visita coincidiu com a renovação do contacto tibetano com o Japão. Uma possível explicação para o convite seria a de que o governo tibetano desejaria manter relações cordiais com os japoneses e seus aliados alemães, como contrapeso aos ingleses e os chineses. Assim, o governo tibetano deu as boas-vindas à expedição alemã por ocasião da celebração do ano novo (Losar), 1939, em Lhasa.

[Ver: O Envolvimento Russo e Japonês com o Tibete Pré-Comunista: O Papel da Lenda de Shambhala.]

Em Fest der weissen Schleier: Eine Forscherfahrt durch Tibet nach Lhasa, der heiligen Stadt des Gottkönigtums (Festival dos Cachecóis Brancos de Gaze: Uma Expedição de Investigação através do Tibete a Lhasa, a Cidade Santa da Terra do Rei-Deus) (1950), Ernst Schäfer descreveu as suas experiências sobre a expedição. Durante as festividades, relatou ele, o Oráculo de Nechung avisou que, embora os alemães tivessem trazido presentes e palavras doces, o Tibete deveria ter cuidado: o líder da Alemanha é como um dragão. Tsarong, o anterior líder pró-japonês das forças armadas tibetanas, tentou suavizar a predição. Disse que o Regente tinha ouvido muito mais do Oráculo, mas que ele próprio não estava autorizado a divulgar os detalhes. O Regente reza diariamente para que não haja guerra entre os ingleses e os alemães, dado que isto também viria a ter consequências terríveis para o Tibete. Ambos os países devem compreender que todas as boas pessoas devem rezar o mesmo. Durante o resto da sua estada em Lhasa, Schäfer reuniu-se frequentemente com o Regente e teve com ele um bom relacionamento.

Os alemães estavam extremamente interessados em estabelecer relações amigáveis com o Tibete. A sua agenda, no entanto, era ligeiramente diferente da dos tibetanos. Um dos membros da expedição de Schäfer era o antropólogo Bruno Beger, que era responsável pela pesquisa racial. Tendo trabalhado com H.F.K. Günther em Die nordische Rasse bei den Indogermanen Asiens (A Raça Nórdica entre os Indo-Alemães da Ásia), Beger apoiou a teoria de Günther de uma “raça setentrional” na Ásia central e no Tibete. Em 1937, ele tinha proposto um projecto de pesquisa para o Tibete Oriental e, com a expedição de Schäfer, tinha planeado investigar cientificamente as características raciais dos povos tibetanos. Enquanto no Tibete e em Sikkim, no caminho, Beger mediu os crânios de trezentos tibetanos e sikkimeses e examinou algumas das suas outras características físicas e marcas corporais. Concluiu que os tibetanos ocupavam uma posição intermediária entre as raças mongóis e europeias, com o elemento racial europeu mais pronunciadamente marcado entre a aristocracia.

De acordo com Richard Greve, “Tibetforschung in SS-Ahnenerbe (Pesquisa Tibetana na SS-Ahnenerbe)” publicada em T. Hauschild (ed.) “Lebenslust und Fremdenfurcht” – Ethnologie im Dritten Reich (“Paixão pela Vida e Xenofobia” – Etnologia no Terceiro Reich) (1995), Beger recomendou que os tibetanos poderiam desempenhar um papel importante depois da vitória final do Terceiro Reich. Poderiam servir como uma raça aliada numa confederação pan-mongol sob o auspício da Alemanha e do Japão. Embora Beger tivesse também recomendado estudos adicionais para medir todos os tibetanos, no entanto não foram empreendidas quaisquer outras expedições ao Tibete.

Supostas Expedições Ocultistas ao Tibete


Diversos estudos do pós-guerra sobre o nazismo e o ocultismo, tal como The Spear of Destiny (A Lança do Destino) (1973), por Trevor Ravenscroft, afirmaram que, sob a influência de Haushofer e da Sociedade de Thule, a Alemanha enviou expedições anuais ao Tibete, de 1926 a 1943. A sua missão era, em primeiro lugar, encontrar e depois manter contacto com os antepassados arianos em Shambhala e em Agharti, cidades subterrâneas escondidas debaixo dos Himalaias. Lá, os mestres eram os protectores de poderes ocultos secretos, especialmente de vril, e as missões procuravam a sua ajuda na utilização desses poderes para a criação de uma raça mestra ariana. De acordo com estes relatos, Shambhala recusou dar qualquer ajuda, mas Agharti concordou. Subsequentemente, a partir de 1929, grupos de tibetanos foram supostamente à Alemanha e estabeleceram lojas conhecidas como Sociedade de Homens Verdes. Em relação à Sociedade do Dragão Verde, no Japão, por intermédio de Haushofer, ela supostamente ajudou a causa nazi com os seus poderes ocultos. Himmler foi atraído a esses grupos de mestres Tibetanos-Agharti e, supostamente pelas suas influências, estabeleceu o Ahnenerbe em 1935.

Com excepção do facto de que Himmler não estabeleceu o Ahnenerbe, mas, em vez disso, incorporou-o nas SS em 1937, o relato de Ravenscroft contém outras afirmações dúbias. A principal é o suposto suporte de Agharti pela causa nazi. Em 1922, o cientista polaco Ferdinand Ossendowski publicou Bestas, Homens e Deuses, descrevendo as suas viagens através da Mongólia. Nele, relatou ter ouvido falar do reino subterrâneo de Agharti sob o deserto de Gobi. No futuro, os seus poderosos habitantes viriam à superfície salvar o mundo do desastre. A tradução alemã do livro de Ossendowski Tiere, Menschen und Götter apareceu em 1923 e tornou-se muito popular. Sven Hedin contudo publicou, em 1925, Ossendowski und die Wahrheit (Ossendowski e a Verdade), através do qual denunciou as afirmações do cientista polaco. Chamou a atenção de Ossendowski ter recolhido a ideia sobre Agharti da novela de Saint-Yves d’Alveidre, escrita em 1886, intitulada Mission de l’Inde en Europe (Missão da India na Europa) para tornar a sua história mais atraente para o público alemão. Dado que Hedin tinha uma forte influência no Ahnenerbe, é improvável que este departamento tivesse enviado uma expedição especificamente para encontrar Shambhala e Agharti e, subsequentemente, tivesse recebido auxílio do último.