O Livro dos Sábios (1870)
5 de 10 - DISCUSSÕES EM
FORMA DE DIÁLOGO
QUINTO DIÁLOGO - UM PROTESTANTE e ELIPHAS LEVI
O PROTESTANTE — Senhor, escreveste isto num de teus livros: "Eu sou mais católico
que o Papa, mais protestante que Lutero". Qual pode ser o sentido destas
estranhas palavras?
ELIPHAS LEVI — Isto quer dizer que considero como admissíveis à comunhão universal todos aqueles a quem o Papa excomunga e que protesto contra as fantasias dogmáticas de teu mestre, Martin Lutero.
O PROTESTANTE — Pretenderias então fundar uma nova seita?
ELIPHAS LEVI — Pelo contrário; desejaria fundir todas as seitas numa fraternal unidade.
O PROTESTANTE — Podes acreditar que o Papa te aprovará?
ELIPHAS LEVI — O Papa não me censurou ainda.
O PROTESTANTE — E se ele censurasse?
ELIPHAS LEVI — Eu aprovaria a sua censura de antemão.
O PROTESTANTE — Então ris-te dele e de nós?
ELIPHAS LEVI — Não me rio de ninguém. A Igreja Romana tem declarado que a razão é inseparável da fé, que se pode e se deve levar aos homens a fé pela razão e eu não falo outra coisa; não é, pois, o fundo da minha doutrina que o Papa poderia censurar, senão só algumas revelações dos mistérios do ocultismo, que poderia achar perigosas e intempestivas.
O PROTESTANTE — Teria, por certo, muita razão. Porque misturas continuamente a religião e as ciências ocultas? Anuncias livros de magia e escreves livros de religião. Que podem ter em comum a Bíblia e o Grimório?
ELIPHAS LEVI — Os Grimórios compõem-se de evocações e de orações, supõe um dogma e contém um ritual; as ciências ocultas têm como ponto de partida uma teologia secreta que é a Cabala; elas iniciam nos mistérios de uma taumaturgia cerimonial análoga aos sacramentos da Igreja; vês pois, que não se podem ensinar as ciências ocultas sem se falar muito da religião.
O PROTESTANTE — Porque escolheste e proclamas como a melhor, entre todas as religiões, aquela que mais energicamente condena a magia?
ELIPHAS LEVI — Porque é a única que é incontestavelmente dogmática e realmente taumatúrgica; porque a religião romana é a magia hierarquicamente constituída que reprova e deve reprovar os feiticeiros como competidores sem diploma; porque só os sacerdotes católicos são verdadeiros encantadores, evocando ao próprio Deus e forçando-o a descer das suas alturas, devolvendo a inocência aos culpáveis, apagando com uma palavra as sentenças de morte eterna, abrindo e fechando a seu gosto o céu e dispondo da eternidade.
O PROTESTANTE — As coisas que admiras na Igreja Católica são precisamente aquelas que a tornam abominável; os seus sacerdotes não são, para nós, mais do que os encantadores do Faraó, e ao invés de viver com eles, preferimos sofrer com Israel no deserto.
ELIPHAS LEVI — Tens o ceptro de Moisés? Temo que um bom dia te encontres sem Deus e que por fadiga de uma religião sem eficácia, dançarás como tantos outros em torno do bezerro de ouro. Vê ao que chegou a Inglaterra; enjoa-se mortalmente no meio das suas riquezas e o pauperismo a corrói. A Alemanha pode muito bem expandir-se: não converterás jamais o mundo inteiro ao culto do "chucrut" e da cerveja, sua nebulosa filosofia; passando por Kant e por Hegel, chegou a uma desesperante escuridão. Por outro lado, nos países protestantes, a vida das almas retarda-se e todos os cuidados do homem dirigem-se às coisas puramente temporais. Beber bem, comer bem, alguma coisa certa: porém, o homem não vive só de pão, como também o diz o nosso grande mestre.
O PROTESTANTE — Não temos nós a Bíblia e o Evangelho?
ELIPHAS LEVI — Sim, tens e a fazes traduzir em todas as línguas para que seja lida pelos selvagens; aqueles que os mais sábios dentre nós mal compreendem ou não compreendem absolutamente nada. A Bíblia! Esta Babel da antiguidade oriental; este livro sobre o qual empalideceram-se os eruditos de tantos séculos, esta enciclopédia abstracta, que um dos nossos grandes poetas chama com razão de um terrível mar semeado de escolhos! Eis aí o que colocas entre as mãos dos ignorantes e dos idiotas, dizendo-lhes: "Tomai, eis aqui a palavra de Deus, cabe a vós compreender julgar e fazer para vós uma regra de consciência". Por isso quantas interpretações absurdas! O Protestantismo é como uma grande casa de alienados, cheia de celas, as quais Ihes chamam seitas; uns são medrosos, outros dançarinos, muitos são epilépticos, outros imóveis e taciturnos; e talvez, é em nome da razão que chamas ao livre exame; porém, o que é a liberdade sem leis? Não é a mesma coisa que a razão sem autoridade, essa rival impotente da autoridade sem razão?
O PROTESTANTE — Posto que Deus tendo falado na Bíblia, devia querer ser compreendido e inspirar-nos ele mesmo o verdadeiro sentido das suas palavras.
ELIPHAS LEVI — Se Deus tem a obrigação de inspirar-nos, não tens já necessidade da Bíblia. São todos profetas e os teus sonhos são toda a lei.
O PROTESTANTE — Porém, se não me engano, tu mesmo interpretas a Bíblia de outra forma da que os Doutores Católicos.
ELIPHAS LEVI — A Bíblia tem um sentido oculto, cuja ciência tradicional chama-se Cabala, entre os Hebreus. Esta ciência era conhecida pelo apóstolo São João e pelos padres mais sábios da primitiva igreja; eu não a inventei e não ensino nada que venha de mim; isto é o que faz a minha força e a minha confiança, isto é o que me dá o direito de chamar católicos mal lluminados aos católicos melhor instruídos. Podes provar-me que estou errado?
O PROTESTANTE — Não, porque não posso seguir-te nas tuas buscas; porém, guardarei as minhas convicções.
ELIPHAS LEVI — Não pretendo tirá-las; a controvérsia jamais converte ninguém; alguém se apoia nas ideias que quer defender e obstina-se mais nelas à medida que o ataque é mais forte; as convicções apoiam-se ou mudam-se por si mesmas, à medida que a razão cresce e que a luz se faz...
O PROTESTANTE — Desejo que ela se faça para ti.
ELIPHAS LEVI — Restituo-te o mesmo desejo.
ELIPHAS LEVI — Isto quer dizer que considero como admissíveis à comunhão universal todos aqueles a quem o Papa excomunga e que protesto contra as fantasias dogmáticas de teu mestre, Martin Lutero.
O PROTESTANTE — Pretenderias então fundar uma nova seita?
ELIPHAS LEVI — Pelo contrário; desejaria fundir todas as seitas numa fraternal unidade.
O PROTESTANTE — Podes acreditar que o Papa te aprovará?
ELIPHAS LEVI — O Papa não me censurou ainda.
O PROTESTANTE — E se ele censurasse?
ELIPHAS LEVI — Eu aprovaria a sua censura de antemão.
O PROTESTANTE — Então ris-te dele e de nós?
ELIPHAS LEVI — Não me rio de ninguém. A Igreja Romana tem declarado que a razão é inseparável da fé, que se pode e se deve levar aos homens a fé pela razão e eu não falo outra coisa; não é, pois, o fundo da minha doutrina que o Papa poderia censurar, senão só algumas revelações dos mistérios do ocultismo, que poderia achar perigosas e intempestivas.
O PROTESTANTE — Teria, por certo, muita razão. Porque misturas continuamente a religião e as ciências ocultas? Anuncias livros de magia e escreves livros de religião. Que podem ter em comum a Bíblia e o Grimório?
ELIPHAS LEVI — Os Grimórios compõem-se de evocações e de orações, supõe um dogma e contém um ritual; as ciências ocultas têm como ponto de partida uma teologia secreta que é a Cabala; elas iniciam nos mistérios de uma taumaturgia cerimonial análoga aos sacramentos da Igreja; vês pois, que não se podem ensinar as ciências ocultas sem se falar muito da religião.
O PROTESTANTE — Porque escolheste e proclamas como a melhor, entre todas as religiões, aquela que mais energicamente condena a magia?
ELIPHAS LEVI — Porque é a única que é incontestavelmente dogmática e realmente taumatúrgica; porque a religião romana é a magia hierarquicamente constituída que reprova e deve reprovar os feiticeiros como competidores sem diploma; porque só os sacerdotes católicos são verdadeiros encantadores, evocando ao próprio Deus e forçando-o a descer das suas alturas, devolvendo a inocência aos culpáveis, apagando com uma palavra as sentenças de morte eterna, abrindo e fechando a seu gosto o céu e dispondo da eternidade.
O PROTESTANTE — As coisas que admiras na Igreja Católica são precisamente aquelas que a tornam abominável; os seus sacerdotes não são, para nós, mais do que os encantadores do Faraó, e ao invés de viver com eles, preferimos sofrer com Israel no deserto.
ELIPHAS LEVI — Tens o ceptro de Moisés? Temo que um bom dia te encontres sem Deus e que por fadiga de uma religião sem eficácia, dançarás como tantos outros em torno do bezerro de ouro. Vê ao que chegou a Inglaterra; enjoa-se mortalmente no meio das suas riquezas e o pauperismo a corrói. A Alemanha pode muito bem expandir-se: não converterás jamais o mundo inteiro ao culto do "chucrut" e da cerveja, sua nebulosa filosofia; passando por Kant e por Hegel, chegou a uma desesperante escuridão. Por outro lado, nos países protestantes, a vida das almas retarda-se e todos os cuidados do homem dirigem-se às coisas puramente temporais. Beber bem, comer bem, alguma coisa certa: porém, o homem não vive só de pão, como também o diz o nosso grande mestre.
O PROTESTANTE — Não temos nós a Bíblia e o Evangelho?
ELIPHAS LEVI — Sim, tens e a fazes traduzir em todas as línguas para que seja lida pelos selvagens; aqueles que os mais sábios dentre nós mal compreendem ou não compreendem absolutamente nada. A Bíblia! Esta Babel da antiguidade oriental; este livro sobre o qual empalideceram-se os eruditos de tantos séculos, esta enciclopédia abstracta, que um dos nossos grandes poetas chama com razão de um terrível mar semeado de escolhos! Eis aí o que colocas entre as mãos dos ignorantes e dos idiotas, dizendo-lhes: "Tomai, eis aqui a palavra de Deus, cabe a vós compreender julgar e fazer para vós uma regra de consciência". Por isso quantas interpretações absurdas! O Protestantismo é como uma grande casa de alienados, cheia de celas, as quais Ihes chamam seitas; uns são medrosos, outros dançarinos, muitos são epilépticos, outros imóveis e taciturnos; e talvez, é em nome da razão que chamas ao livre exame; porém, o que é a liberdade sem leis? Não é a mesma coisa que a razão sem autoridade, essa rival impotente da autoridade sem razão?
O PROTESTANTE — Posto que Deus tendo falado na Bíblia, devia querer ser compreendido e inspirar-nos ele mesmo o verdadeiro sentido das suas palavras.
ELIPHAS LEVI — Se Deus tem a obrigação de inspirar-nos, não tens já necessidade da Bíblia. São todos profetas e os teus sonhos são toda a lei.
O PROTESTANTE — Porém, se não me engano, tu mesmo interpretas a Bíblia de outra forma da que os Doutores Católicos.
ELIPHAS LEVI — A Bíblia tem um sentido oculto, cuja ciência tradicional chama-se Cabala, entre os Hebreus. Esta ciência era conhecida pelo apóstolo São João e pelos padres mais sábios da primitiva igreja; eu não a inventei e não ensino nada que venha de mim; isto é o que faz a minha força e a minha confiança, isto é o que me dá o direito de chamar católicos mal lluminados aos católicos melhor instruídos. Podes provar-me que estou errado?
O PROTESTANTE — Não, porque não posso seguir-te nas tuas buscas; porém, guardarei as minhas convicções.
ELIPHAS LEVI — Não pretendo tirá-las; a controvérsia jamais converte ninguém; alguém se apoia nas ideias que quer defender e obstina-se mais nelas à medida que o ataque é mais forte; as convicções apoiam-se ou mudam-se por si mesmas, à medida que a razão cresce e que a luz se faz...
O PROTESTANTE — Desejo que ela se faça para ti.
ELIPHAS LEVI — Restituo-te o mesmo desejo.
(Continua)
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