AS FALTAS DO SER HUMANO
Depois da sociedade primitiva dar
lugar à chamada sociedade civilizada há a sensação de que a humanidade está a
trilhar uma senda divergente dos desígnios naturais. Muitos pensadores deram o
alerta, a começar por Bacon (1561 – 1626) que na altura aconselhou a humanidade
a procurar vencer a natureza obedecendo-lhe e não o inverso em que o Homem
desafia e pretende “domesticar” a natureza, até utilizar “alegremente” a
energia nuclear para fins bélicos, destruir os recursos naturais e sistemática
destruição do meio-ambiente.
Autores que trabalham em programas de
futurologia, como Alvin Toffler, antecipam consequências e propõem medidas
correctivas, contrariado abertamente algumas conclusões de entidades
“oficiais”, como a OCDE, que apontam para a possibilidade de, a médio prazo, se
poder contrariar a crise momentânea criada pelos fluxos mundiais de
dificuldades, com excesso de população e investimentos destinados à agricultura
e poluição. Como sempre, os valores económicos do momento prevalecem e as
Corporações dominam o planeta, conforme os seus interesses.
A estrutura básica das sociedades
quase não tem evoluído, nem aprendido com os seus erros e vícios históricos (primeiro o lucro, depois as pessoas e o meio
onde vivem).
No entanto, paradoxalmente, a ciência
e a técnica progridem em passo acelerado para tentarem corresponder às
exigências postas pela população cada vez maior. As soluções que se impõem (pela filtragem a que são sujeitas pelas
corporações) nada têm a ver com os problemas do mundo físico, mas sim com a
própria natureza humana, com o comportamento instintivo básico. O nível
cultural da humanidade é o factor de importância relevante pelos reflexos
imediatos (pouco exigentes) que tem
na organização social e comportamento ambiental colectivos. São pura e
simplesmente ignorados, não informados e não educados. Este nível cultural, de
respeito pela natureza, não acompanha o desenvolvimento da ciência.
Há quem aponte o cristianismo (o sistema europeu que rege a humanidade)
como culpado da actual crise do meio ambiente pelo modo de relacionamento com a
natureza. O ocidental partiu do princípio de que o facto de o lugar central que
o Homem ocupa no mundo lhe dá a profunda convicção de que toda a realidade está
ao seu serviço. “Encham a Terra e dominem-na” (Génesis 1:
26-28). Esta convicção de superioridade e domínio manifesta-se sobre todos
os seres vivos (Génesis 2:19).
De facto, nos textos bíblicos não se
encontram afirmações de que a má actuação do Homem se repercuta no equilíbrio
da natureza. Mas são vários os passos em que podemos subentender que o Cosmo, a
Criação, é um sistema interactivo.
O fim do Génesis fala-nos da Criação como um ordenamento do Caos (Génesis 1) em que intervêm forças celestes respeitadoras de “uma
Lei que jamais será violada”. (Salmos
148:6). Do mar às estrelas, todo o Universo se encontra sob a mesma ordem
cósmica que também se impõe aos humanos. Esta ordem cósmica possui analogias
com o que se encontra nas outras culturas não cristãs.
O prólogo do Evangelho de João (1: 1-18) descreve o desencadeamento do
processo da Criação ao referir a “alocação das sílabas da Palavra (ou do Verbo)
marcou estádios sucessivos na evolução do mundo e do Homem”.
A evolução processa-se pela passagem
da energia (a substância-raiz-cósmica do
caos) para a matéria. Será um
processo em que os elementos se agregam segundo a lei da auto-organização e da
complexidade crescente, para se tornarem a matriz geradora da Vida.
Esta complexidade não significa uma
simples acumulação de elementos, como num monte de areia, ou uma simples
repetição geométrica e indefinida de unidades, como na cristalização.
Mesmo assim, eu penso, como muitos
outros, que a matéria é espirito cristalizado.
Mas, esta acumulação de elementos é
uma forma particular e superior de agrupamento onde um certo número de
elementos acaba por formar uma estrutura capaz de assimilar e reproduzir-se no
mundo material. Terá sempre um aspecto visível e exterior (corpo físico) e outro interior e oculto, de espírito, formando
ambos a unidade de espírito-matéria. O espírito, que é evidente no Homem e cuja
parceria com o corpo físico e experiência na matéria criou uma Alma (Mente, Ego) individual. Esse espírito,
um átomo do espírito universal, doado para vivificar o novo ser material, que
já se vislumbra nos animais, também subsiste nos estados de complexidade mais
elementar, embora tão infinitamente diluído que escapa aos nossos vulgares
métodos de detecção do orgânico.
Como a matéria é Espírito
cristalizado, o espírito universal está lá.
Tendo em conta esta realidade não faz
sentido pensar em matéria inerte, ou “bruta”. As confissões cristãs, que não
têm reflectido esta realidade na vida, abriram caminho a um certo
desprendimento pela natureza enquanto expressão de uma lei universal que impõe
uma interacção e interdependência total. Neste caso o Homem integra-se numa
visão evolutiva do próprio Universo. Não pode separar-se do mundo a que
pertence, e é sintomático o facto de as religiões terem evoluído paralelamente
com a evolução do Homem.
E o facto constatado é que a religião,
a evolução espiritual, tem evoluído muito lentamente, abrindo um fosso entre os
assuntos do espírito e os assuntos da matéria assumidos pela ciência cuja evolução
está descontrolada, pela falta desse filtro espiritual. E mais ao serviço do
mal do que do bem.
Ao desligar-se o “natural” do
“sobrenatural” o Homem avança sem freio, sem uma consciência ética e moral que
o faça reflectir e agir pelo bem comum, como se vê nos dias de hoje em que o
avanço científico e tecnológico é orientado para adquirir poder e riqueza na
Terra, com milhões de mortos.
Essa riqueza e avanço tecnológico não
são empregues para matar a fome no mundo, eliminar as doenças e aliviar os menos
favorecidos. Milhões de pessoas morrem de sede na Terra, enquanto a ciência
gasta riqueza para descobrir água em Marte. Hoje não há ética, nem consciência,
porque se preocupam mais em criar leis para legalizar actos que por serem
legais põem de lado o direito consuetudinário, a moral e a ética e ficarem de
consciência tranquila. É o caso de, por exemplo, em Portugal, um político
exigir subsídios, ou de integração na vida fora da política, ou de habitação
dando dados falsos, só porque é permitido por lei. Não entra em conta um
princípio ético, que os impeça de exigir subsídios não só porque não está certo
como até são imorais face á sociedade em que a esmagadora maioria nada tem e
ainda lhes cortam pequenos subsídios que lhes permitiam sobreviver com dignidade.
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